Sobre “Paraísos artificiais”

(Breve comentário de Lucas Laurentino, UFRJ)

A relação de um sujeito com o lugar em que nasce não costuma ser algo evidente. Não há qualquer indício de uma predisposição para amar a terra natal mais do que odiá-la, ou mesmo ser indiferente a ela. O que acontece, por via de regra, é uma educação cultural que conta aos mais jovens a história do seu lugar de origem e os ensina a se sentirem orgulhosos por pertencerem a ele. No entanto, somente quando se toma certa distância é que se pode refletir sobre este lugar de nascimento e vê-lo sem as lentes distorcidas de uma visão que se quer patriótica ou nacionalista.
Jorge de Sena sempre revelou problemas com a ideia de uma identificação plena ao seu Portugal. Em sua poesia, procurou pensar o país em que nascera a partir de suas contradições e discursos oficiais (do salazarismo). Daí que em um dos seus primeiros livros de poesia, Pedra Filosofal, encontramos como poema de abertura “Os paraísos artificiais”, de 1947, no qual há um demorado olhar sobre a sua terra natal e um questionamento da celebrada nostalgia, do amor à pátria, da sua idealização. Dialogando com Baudelaire pelo título e com Gonçalves Dias pelo seu começo “Na minha terra…”, Jorge de Sena constrói, com ironia, uma poderosa crítica ao nacionalismo ignorante, à censura, à hipocrisia de um discurso que se descola da realidade para vender uma imagem falsa de nação, enfim, a tudo aquilo que cerceia a liberdade do sujeito de ser e de criar.
Ouçamos, então, este emblemático poema na voz de Mário Viegas: